Foi na Quinta do Palame, em Freixiel, que participei pela primeira vez nas vindimas. Uma tradição antiga que, outrora, mobilizava centenas de pessoas de todas as idades. Atualmente, com o avanço tecnológico, a realidade é outra. A despeito de toda esta mecanização, na aldeia o processo permanece igual: a uva apanha-se com as mãos. Procurei descobrir o porquê de se querer manter esta tradição tão viva.
O tórrido calor de setembro dá início à época das vindimas na região do Douro, uma tradição antiga que, noutros tempos, mobilizava centenas de pessoas de todas as idades. Os vindimantes acordavam antes do sol raiar, apanhavam as uvas, cacho a cacho, com perícia e cuidado e transportavam-nas para o lagar em celhas. O pisar da uva era o passo seguinte. Até ficarem esmagadas. Um trabalho demorado e cansativo que exigia bastante esforço físico.
Os tempos mudaram e trouxeram as máquinas de vindimar, que fazem desde a apanha da uva ao processo de liquidificação. No entanto, na aldeia de Freixiel, a apanha da uva é feita como noutros tempos: à mão.
E não é um processo fácil. Exige resistência, dedicação e força de vontade. São 8h seguidas – com uma pausa de 1h para almoçar – a caminhar entre valados, sob o sol abrasador e com as costas dobradas para conseguir que não fique qualquer cacho de uva para trás. Ao final do dia, sente-se o peso nas pernas, mas o dever foi cumprido.
O dia estava quente e o relógio marcava as 10 da manhã. Embora ainda fosse cedo, já os “colegas” trabalhavam há mais de 3 horas. Estão calejados.
Cerca de 15 companheiros, a maioria entre os 40 e os 60 anos, com a pele queimada pelo sol e o suor a escorrer-lhe pela face, sorriam animados. Decidi aproximar-me e saber se seriam recetíveis à minha participação. “Venha, venha, menina! Junte-se a nós!”, disse pronta a D. Lurdes, “A menina já cá devia estar desde o início! Tome lá esta tesoura de podar!”.
Muno-me da tesoura de cortar as uvas. Nunca tinha visto nada parecido. Confesso o quão melindrosa é a minha relação com tesouras. No entanto, estava motivada e aprontei-me a participar, até porque queria alardear a minha costela transmontana.
Que grande ilusão a minha! Descobri que estava lá só para brincar às vindimas e quase cortei o dedo na primeira tesourada. O senhor João viu, ajudou-me e ensinou-me a técnica. Não é trabalho de grande mestria, mas exige alguns cuidados. A tesoura fica por cima e a uva deve ser agarrada pelo “rabo” para que não caia no chão. De resto, é preciso atenção ao corte, até porque não convém ficar sem dedos.
Os meus companheiros percorriam os valados num ritmo frenético que me custava a acompanhar. Caminhavam animados. O peso da idade não os impedia de rir, conversar e até dançar ao som de uma alegre música pimba. Depois desta experiência, tenho a certeza: A leveza do campo é incomensurável e trespassa qualquer dor ou constrangimento físico.
O pouco tempo com eles não foi suficiente para sentir o peso do trabalho de campo na manhã seguinte. Mas quando penso no sorriso em cada rosto cansado, apercebo-me que não era pelo trabalho, mas sim pelo convívio. Por manter viva a tradição.
Vi nostalgia dos seus tempos de infância e um recordar o passado que pertencia aos seus ancestrais. Ao vindimar honravam o tempo de meninez e quão dura foi a vida dos seus pais e avós e bisavós, que de sol a sol labutavam para ter pão na mesa ao final do dia. Não é fácil ser do campo, mas o que lá se vive, não pode ser experienciado em mais lado nenhum.
Se procura experiências novas e desafiantes, visite o nordeste transmontano. Descubra, durante o dia, as pequenas maravilhas e encantos que a região tem para lhe oferecer e, ao final do dia, descanse na Quinta do Palame, lugar tranquilo e acolhedor que deve ser apreciado junto a um bom vinho do Douro.
Para reservas na Quinta do Palame ligue para o +351 96 283 99 66.
Filipa Neves